O grupo dos carboidratos não fibrosos é constituído pelos açúcares e amido, sendo assim classificados por estarem presentes no conteúdo celular e serem fontes de energia prontamente disponíveis ou de reserva para a planta. A exceção é a pectina, que é um polissacarídeo amorfo contido na parede celular, mas que é também classificado como carboidrato não fibroso por ser totalmente solúvel em detergente neutro e ser rápido e extensamente degradável pelos microorganismos ruminais.
O amido é um polissacarídeo não estrutural de elevado peso molecular e sintetizado pelas plantas superiores com função de reserva energética pelos períodos de dormência, germinação de grãos, crescimento e rebrota. Os grãos são as principais fontes de amido na alimentação humana e animal, podendo conter até 80% de seu peso seco em amido. O amido é composto por dois polímeros de glicose, a amilose e a amilopectina, as quais são ligadas por pontes de hidrogênio. A porcentagem de amilose e amilopectina varia com a origem botânica do amido, mas na maioria das espécies, o amido é composto por 30% de amilose e 70% de amilopectina. Além da amilose e da amilopectina, os grânulos de amido são compostos por lipídeos, proteínas e minerais, cuja composição é dependente da espécie e da parte da planta onde se encontra.
Os grânulos íntegros apresentam baixa capacidade de absorção de água por serem estabilizados por grande quantidade de pontes de hidrogênio inter e intramoléculas de amilose e amilopectina. Diversos tipos de processamentos são aplicados aos cereais com a finalidade de romper as pontes de hidrogênio dentro dos grânulos de amido, melhorando a sua capacidade de hidratação. Dessa forma o amido torna-se mais susceptível à digestão enzimática.
Os grânulos de amido do milho e do sorgo, principalmente, são revestidos por uma matriz proteica que dificulta o acesso das enzimas digestivas. O processamento dos grãos objetiva danificar ou destruir essa matriz proteica para aumentar a digestibilidade dos grãos.
A moagem fina ou grossa, extrusão, micronização, tostagem, peletização e laminação são exemplos de processamento a seco, enquanto maceração, laminação a vapor, floculação, reconstituição, explosão, cozimento a vapor são processamentos que envolvem a adição de água aos grãos, frequentemente na forma de vapor e com pressão. A união dos dois processos, redução de tamanho de partícula e aplicação de vapor, melhora ainda mais a eficiência da digestão dos alimentos processamento pelos ruminantes.
A maior parte do amido no grão de milho se encontra unida ao endosperma em forma de grânulos. Em milho amarelo dentado típico, os grânulos de amido são compostos por aproximadamente 27% de amilose e 73% de amilopectina. A natureza linear da amilose permite que o amido forme um agregado de moléculas compacto e cristalino quando seco. Em contraste, a estrutura ramificada a amilopectina restringe o ligamento entre moléculas e não permite que se forme um agregado compacto delas. O tipo e o grau de processamento são críticos em alterar a digestibilidade e o uso dos nutrientes pelo animal.
O aquecimento dos grãos na presença de água promove a solubilização parcial do amido, nos quais os grânulos perdem a cristalinidade. Esse processo é denominado gelatinização e ocorre devido à quebra das pontes de hidrogênio entre as moléculas de amilose e amilopectina, permitindo a entrada de água dentro dos grânulos. A temperatura de gelatinização do amido varia com o tipo de grão, o que pode refletir as diferenças na composição bioquímica do amido e a interação desse com a matriz protéica. O amido gelatinizado, no entanto, é instável e tende a se reorganizar parcialmente com as reduções de temperatura e do conteúdo de água do meio em virtude do restabelecimento parcial das pontes de hidrogênio. No entanto a estrutura primária dos grânulos de amido é definitivamente perdida. Esse processo de reorganização dos grânulos é denominado retrogradação e tende em aumentar a proporção de amido resistente ao ataque da amilase dos alimentos previamente gelatinizados, o que pode reduzir a digestibilidade ruminal e intestinal desses amidos.
Até certo ponto o aumento da participação ruminal na digestão do amido proporcionada pelo processamento é benéfico nutricionalmente, pois aumenta a disponibilidade de energia rapidamente fermentável no rúmen, com consequentes aumentos das produções de proteína microbiana e de ácidos graxos de cadeia curta totais. No entanto, os efeitos adversos decorrentes da maior disponibilidade do amido são a acidose ruminal (aguda ou crônica), as reduções da digestibilidade dos carboidratos estruturais da dieta e das ingestões de forragem e de matéria seca.
Segundo Owens et al. (1986), a extensão da digestão do amido no rúmen e no trato digestório total foi maior para os grãos de milho e de sorgo moídos finos e floculados a vapor que laminados ou moídos grosseiramente. Dessa forma o suprimento de amido para o intestino delgado é maior quando o milho e o sorgo são fornecidos aos animais com maiores tamanhos de partícula. Contudo as grandes partículas de grãos que escapam da fermentação ruminal apresentam baixa digestibilidade intestinal, sendo parcialmente fermentadas no intestino grosso e eliminadas nas fezes. Comparados com métodos que reduzem o tamanho da partícula dos grãos, a ensilagem foi o mais efetivo em aumentar a digestão do amido, principalmente no rúmen. A possível razão do aumento da digestibilidade do amido após a ensilagem é que o pH ácido de silo favorece a solubilização parcial da matriz proteica desses grãos, facilitando o acesso do amido pelos microrganismos ruminais.
A degradação ruminal de carboidratos não estruturais (CNE) é geralmente rápida. No entanto, é dependente de um ambiente ruminal favorável. Nesse sentido, prover quantidade adequada de carboidrato estrutural e, principalmente, proteína, é essencial para sincronizar a disponibilidade desses nutrientes para utilização pelos microrganismos ruminais.
O processo de digestão ruminal é uma sequência dinâmica e sinérgica de eventos que influenciam a fermentação e os produtos finais e o destino desses carboidratos pós-ruminalmente. A ação em que esses processos são manifestados no sistema são altamente dependentes do tipo e quantidade das fontes de amido consumido pelo animal.
A taxa (velocidade em que o amido é digerido) e a extensão (quantidade de amido digerido) são componentes críticos no processo de digestão. Outros fatores que influenciam na digestibilidade do amido são: processamento do grão (milho floculado e ensilado são mais disponíveis que laminado e inteiro), tamanho de partícula (partículas menores são mais acessíveis) e a taxa de passagem (menor taxa de passagem permite maior tempo de permanência no compartimento e, consequentemente, maior degradabilidade).
A taxa e a extensão da degradação ruminal pode ser alterada pelo tipo de grão oferecido (vítreo ou dentado), quantidade ingerida (kg), tratamento do grão e composição da dieta (volumoso/concentrado). Portanto, a digestão em cada sítio (rúmen, ID ou IG) pode aumentar ou diminuir dependendo desses fatores isolados ou suas interações.
O consumo total de amido (kg/dia) foi correlacionado positivamente com consumo de amido degradável no rúmen (kg/dia), amido escapando do rúmen e digestibilidade intestinal do amido.
Digestão ruminal é altamente correlacionada com a digestibilidade no trato total. Da mesma forma, a digestibilidade no intestino também apresenta correlação positiva, no entanto, essa correlação é menor.
Entre os fatores que interferem na digestão de amido estão a composição química e a forma física do amido, presença de barreiras nos grãos dos cereais, fatores antinutricionais, a forma física do alimento fornecido e os diferentes tipos e intensidades de processamentos aplicados aos alimentos.
A extensão da digestão do amido no rúmen parece ser mais determinada pela natureza do material que circunda e protege o grânulo de amido em si. Nesse contexto, o acesso dos microrganismos ruminais aos grânulos de amido é determinado pelas taxas de degradação da parede celular das células endospermas e principalmente da matriz protéica.
Concomitantemente ao processo fermentativo, parte da digesta ruminal, representada principalmente por partículas menores e mais densas saem deste compartimento em direção ao abomaso e intestino delgado. A digestão abomasal e intestinal nos ruminantes têm algumas particularidades. Uma das
principais é que o fluxo de digesta a partir do rúmen é relativamente contínuo e não-pulsativo como em monogástricos. Da mesma forma, as enzimas também são secretadas mais continuamente e em menores concentrações que em monogástricos, principalmente aquelas responsáveis pela digestão intestinal dos carboidratos e lipídios. Os carboidratos que chegam com a digesta ao abomaso e intestino delgado são representados, principalmente por aqueles do alimento que não foram fermentados pelos microrganismos ruminais e também por quantidades variáveis de carboidratos presentes nas células microbianas.
A digestão de carboidratos está dividida em duas fases. A primeira fase, ou fase luminal, consiste da ação exclusiva da enzima pancreática α-amilase, a qual trabalha extensivamente sobre as cadeias de amilose e amilopectina clivando as ligações α[1,4], gerando, em primeiro plano, cadeias menores de monossacarídeos (oligossacarídeos), denominadas dextrinas. Estas, por sua vez, continuam a sofrer o processo de clivagem pela α-amilase, resultando em di ou trissacarídeos e pequenos sacarídeos, denominados dextrinas limites, os quais correspondem aos pontos de ramificação das cadeias de amilopectina.
Os produtos da digestão prévia de amido, conjuntamente com os demais açúcares dietéticos passam a ser trabalhados por enzimas específicas localizadas na superfície da membrana das células epiteliais, as quais promovem a formação de monossacarídeos, os quais são disponibilizados para o transporte.
A absorção de glicose pelas células intestinais apresenta duas fases temporais distintas, as quais afetam intensamente os mecanismos celulares empregados nesta ação.
Ao início do processo de digestão, a concentração de glicose no lúmen intestinal é suficientemente superior àquela observada no meio intracelular, fazendo com que um gradiente de concentração favorável se forme e o monômero possa ser absorvido passivamente por difusão facilitada.
Entretanto, à medida que o processo absortivo se intensifica, este gradiente sofre um processo de inversão, fazendo com que o transporte se realize com concentrações intracelulares de glicose superiores àquelas observadas no lúmen intestinal.
Neste ponto, ativa-se o sistema de co-transporte de sódio, o qual acopla-se, conjuntamente à glicose, a uma proteína transportadora específica localizada na membrana celular. O gradiente eletroquímico para a absorção do sódio é tão elevado que fornece energia para a movimentação da glicose contra seu gradiente de concentração. Embora este sistema, em primeiro plano, não envolva gasto direto de ATP, energia química deve ser gasta para a manutenção do gradiente extracelular de sódio.
A quantidade de amido que chega ao intestino delgado é produto da interação de vários fatores, como a quantidade de dieta consumida, da fonte do amido, do tamanho de partícula, da taxa de digestão no rúmen e da taxa de passagem de líquidos e sólidos. O padrão de comportamento único de cada uma dessas variáveis resulta no suprimento variável de amido ao intestino delgado para ser digerido até glicose.
Uma compilação de dados relacionados com o suprimento de amido e a digestibilidade intestinal em ruminantes alimentados com grãos processados de diferentes maneiras não mostrou nenhum indício de que o aumento do suprimento de amido no ID tenha reduzido a digestibilidade do amido neste local. O autor então considera que existem outras limitações a digestão intestinal, como rápida taxa de passagem e maior tamanho de partícula que chega ao ID. Com base em estudos metabólicos utilizando infusão de amido no abomaso e intestinos, o autor propôs a existência de limites quantitativos ao em vez de proporcionais a digestão e absorção do amido no intestino delgado.
Os fatores específicos tidos como responsáveis são:
1) Atividade limitada da amilase, maltase ou isomaltase, devido à produção insuficiente, condições de trabalho inadequadas ou presença de inibidores enzimáticos.
De acordo com o autor, se a atividade enzimática limita a digestão do amido no ID, então a extensão da digestão deveria diminuir à medida que o suprimento de amido aumenta. Existem resultados de diferentes estudos que dão suporte a esta hipótese, mas deve-se levar em consideração fatores que podem levar a conclusões errôneas nestes estudos como diferenças entre dietas e estudos com a técnica de infusão do amido no abomaso e íleo que podem alterar interpretação de dados, já que o fluxo de infusão é bastante diferente das condições fisiológicas dos animais. Além disso, a atividade da
maltase e isomaltase também não parecem limitantes à digestão do amido no ID.
2) Limitada absorção de glicose no intestino delgado. Mas esta revisão não deixa claro se a absorção de glicose pode limitar a digestão de amido no ID.
3) Tempo insuficiente para completar a hidrólise do amido. A taxa de passagem, bem como a taxa de diluição do amido, que limita a exposição de partículas na parede do intestino também pode limitar a digestão do amido no ID
4) Acesso inadequado das enzimas ao grânulo de amido. A acessibilidade das enzimas e microorganismos ao grão de amido, bem como sua digestibilidade varia indiretamente com o tamanho de partícula do grão.
Nocek e Tamminga (1991) avaliaram a relação entre a quantidade de amido que escapa da fermentação ruminal e a digestão intestinal desse para determinar se digestão pós-ruminal do amido era limitante. Houve uma relação linear positiva entre as duas variáveis, indicando que o aumento da quantidade de amido que escapou da fermentação foi acompanhado pelo aumento da quantidade de amido digerido no intestino delgado. A regressão sugeriu que a digestibilidade do amido no intestino delgado foi de 73%, e que o duodeno de vacas de leite podem digerir mais de 4,0 Kg de amido por dia. Porém foi demonstrado que a eficiência da digestão foi reduzida linearmente com o aumento da quantidade de amido que escapou da fermentação ruminal.
Estudos com infusão de glicose no rúmen ou ID têm demonstrado que a eficiência da utilização da energia é maior se o carboidrato for absorvido no ID.
Energeticamente, a digestão no ID oferece vantagens sobre a eficiência da fermentação ruminal de carboidratos não-estruturais, assim, a digestão no intestino delgado deve ser otimizada.
Em algumas situações pode ser benéfico suprir mais amido para o ID. Quando se suplementa milho inteiro ou grosseiramente quebrado a digestão ruminal diminui, passando mais amido para o ID. No entanto, como as partículas são relativamente grandes, dificulta a ação enzimática intestinal. Além disso, a taxa de passagem dessas partículas mais grosseiras e densas é acelerada, o que diminui ainda mais a digestibilidade no trato total. Assim, o objetivo inicial de aumentar a eficiência energética da utilização do cereal através da mudança do sítio de digestão do rúmen para o ID pode ser anulada.
As vísceras drenadas pela veia porta compreendem o trato gastrointestinal, pâncreas, baço e tecidos adiposos mesentérico e omental. Desses, o trato gastrointestinal é considerado um dos órgãos mais ativos metabolicamente dos ruminantes,pois consome 25% de todo oxigênio absorvido, apesar de representar apenas 6% do peso corporal dos animais. As necessidades energéticas do TGI são supridas em grande parte pelos nutrientes localmente, principalmente ácidos graxos de cadeia curta, podendo representar até 24% de toda a energia metabolizável absorvida. Esses dados enfatizam claramente a importância que o TGI tem sobre o metabolismo energético dos animais.
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