Nos últimos anos, a área destinada para a pecuária está se reduzindo, devido à expansão da agricultura, sendo as pastagens naturais ou plantadas substituídas por grandes culturas, como a soja, o algodão e a cana-de-açúcar. Neste contexto, o confinamento é uma boa alternativa, pois permite que se diminua a idade de abate dos animais e que se aumente a capacidade de suporte das propriedades, promovendo o aumento da produção e otimizando o uso da área já existente. Além disso, o confinamento também reduz o tempo de retorno do capital investido, permite terminar animais em épocas de preços mais favoráveis e evita a perda de peso dos animais durante o tempo de escassez de alimentos.
Apesar das vantagens citadas acima a prática de confinar animais ainda é onerosa e o custo com alimentação é o principal fator determinante para bons resultados, podendo variar de acordo com a região, disponibilidade de grãos e resíduos da agricultura ou agroindústrias. Em diversas regiões do Brasil, o preço de concentrados como milho, sorgo e outros subprodutos (e.g. casca de soja) são tão baixos, que o custo da unidade de energia do volumoso é muito mais dispendioso do que a dos concentrados. Neste ambiente econômico, dietas de alto concentrado são muito interessantes e podem ser necessárias para viabilizar a atividade.
No Brasil inúmeros insucessos e enormes perdas econômicas ocorreram em situações onde tentou-se utilizar dietas de alto concentrado, do tipo utilizado nos EUA, em bovinos confinados. Os problemas ocorrem em parte porque bovinos 100% Zebu parecem apresentar uma maior tendência a desenvolver acidose, laminite, consumo flutuante e redução do ganho de peso.
Com emprego de dietas com alto teor de concentrado há maiores possibilidades de ocorrência de distúrbios metabólicos, como a acidose láctica. A acidose ocorre em consequência do acúmulo de ácido lático no rúmen, devido ao incremento súbito na quantidade de carboidratos administrados aos animais ou troca brusca de rações com baixo valor energético, acompanhado de pouca ou nenhuma fibra ou sem uma adaptação prévia dos animais a estes tipos de alimentos. Por esse motivo têm-se utilizado aditivos, como antibióticos e ionóforos, que visam manter a saúde dos animais e permitir-lhes melhor aproveitamento dos alimentos, reduzindo a incidência desses distúrbios fisiológicos.
Os antibióticos ionóforos mais comercializados como a monensina, são frequentemente utilizados como aditivos na alimentação de bovinos, com o objetivo de aumentar a eficiência alimentar. São produtos da fermentação de vários actinomicetos, sendo a monensina produzida por linhagens de Streptomyces cinnamonensis, utilizada originalmente como agente anticoccidiostático em dietas de aves. A partir de 1967, com a observação de que possuía atividade moderada sobre bactérias gram-positivas, a monensina passou a ser testada sobre microrganismos ruminais, com o objetivo de aumentar a eficiência alimentar.
Os ionóforos são moléculas altamente lipofílicas e capazes de transportar íons através das membranas celulares. No rúmen, associam-se às membranas das bactérias gram-positivas, permitindo a passagem de sódio e prótons para o interior celular e dissipando o gradiente eletroquímico na membrana, o que diminui a entrada de substratos fermentáveis na célula e o metabolismo celular. Em razão da diminuição da taxa fermentativa das bactérias gram-positivas, há uma menor produção de H2 e CO2 e uma menor oxidação de aminoácidos. Consequentemente, diminui a produção de propionato no rúmen, principalmente por favorecer o crescimento de bactérias gram-negativas produtoras de propionato. Além disso, os ionóforos inibem as bactérias produtoras de lactato, impedindo a queda de pH ruminal em animais alimentados com dietas ricas em grãos. O aumento da eficiência alimentar em animais que recebem ionóforos é resultado do aumento da produção de propionato, da redução da energia perdida como metano e do aumento da passagem de proteína do alimento para os intestinos sem ser degradada no rúmen.
A monensina tem sido utilizada para prevenir pequenas alterações diárias no pH ruminal, à medida que aumenta a proporção no rúmen de bactérias consumidoras de lactato, Megasphaera elsdenii e de Selenomonas ruminantium, resistentes á monensina. Entretanto, a taxa de crescimento destas bactérias é lenta e pode não acompanhar as situações de crescimento de Streptococcus bovis para estabilizar o pH. Por outro lado, as consumidoras de lactato são muito sensíveis á elevação do pH, que pode ser oriunda da privação ou falta momentânea de alimento no cocho, situações que ocorrem em confinamentos comerciais por falha de equipamentos ou manejo. Esta interrupção no fornecimento de alimento causa uma ruptura no balanço microbiano e quando o alimento é re-introduzido, há a propensão para que o pH ruminal caia ainda mais, pois o crescimento das consumidoras de lactato é lento.
Em relação aos países que apresentam condições climáticas, produtivas e de tipo de rebanho com condições semelhantes ao Brasil destaca-se a Austrália. Dentre as características que este país apresenta, destaca-se o crescimento do uso do confinamento, energia mais barata a partir de mais grãos do que volumosos e, portanto, uso de dietas de alto concentrado e presença de animais Bos indicus. Neste contexto, a virginiamicina tem sido utilizada como estratégia para redução da incidência de acidose.
Recentemente, o FDA americano terminou um extensivo e detalhado estudo de avaliação da segurança ao consumidor do uso da virginiamicina. Os resultados publicados destes estudos liberam o uso da virginiamicina para o maior mercado importador de carne do mundo. Da mesma forma este produto está liberado para uso em bovinos no segundo maior exportador em volume e maior exportador em valor de carne do mundo, a Austrália. Nota-se também que o Japão, pais que paga o maior valor agregado por carne de qualidade, libera o uso de virginiamicina.
A virginiamicina é um antibiótico pertencente ao grupo das estreptograminas, que formam um grupo relativamente pequeno e homogêneo, e englobam compostos muito relacionados como a pristinamicina, micamicina e vernamicina. Eles atuam por meio de ligação com os ribossomos, inibindo a síntese de proteína.
Estudos in vitro mostraram que a virginiamicina tem maior controle sobre a produção de lactato que a monensina, porque tem ação direta sobre as espécies produtoras de lactato. Isto sugere que a virginiamicina pode ajudar na estabilização do consumo alimentar e diminuir a incidência de rumenites, acidose ruminal e abscessos hepáticos em bovinos consumindo dietas com alto teor de concentrado.
Um quadro de acidose foi induzido por este mesmo grupo, através da administração intraruminal de uma mistura aquosa de amido e grãos moídos de milho. Como no primeiro experimento, os animais foram tratados com virginiamicina (175 mg/animal/dia) ou monensina/tilosina (250 + 90 mg/animal/dia), com o objetivo de se avaliar o efeito dos tratamentos sobre pH ruminal, concentração de lactato e contagem de Fusobacterium necrophorum. A mistura aquosa induziu a acidose ruminal aguda (pH de 4,36 e concentração de lactato de 19,4 mM) no tratamento controle em 36 horas. Em comparação com o controle, a virginiamicina e monensina/tilosina proporcionaram maior pH ruminal, mas a virginiamicina mostrou maior pH às 3, 6, 9 e 12 horas após a administração da mistura de carboidratos, enquanto que monensina/tilosina apresentou aumento de pH apenas somente às 6 horas após a indução. O pH ruminal somente foi similar para ambos os tratamentos (virginiamicina e monensina/tilosina) após 51 horas. Quando os animais controle apresentaram acidose aguda às 36 horas, com um pH de 4,36, os animais tratados com virginiamicina apresentaram pH ruminal de 5,8.
Este trabalho também mostrou a efetividade da virginiamicina ao reduzir o lactato em relação aos demais tratamentos. Enquanto a concentração de lactato alcançou valores de 19,4 e 15,8 mM, respectivamente, no controle e nos tratados com monensina/tilosina, a concentração de lactato nos animais tratados com virginiamicina permaneceu abaixo de 2 mM. Embora aparentemente monensina e virginiamicina apresentem similares aplicações, há indícios que seus efeitos sejam complementares sobre o controle de acidose e sobre a proteólise e geração de amônia no rúmen. No caso do controle de acidose, a virginiamicina atua sobre as espécies produtoras de lactato e Fusobacterium necrophorum, enquanto a monensina aumenta a proporção das utilizadoras de lactato, Megasphaera elsdenii e Selenomonas ruminantium.
O que achou do nosso artigo?
Deixe seu comentário! Queremos saber o que estão achando dos nossos artigos, seu feedback é importante para nós! E se nossos artigos estão te ajudando, conte para nós aqui do lado, nos depoimentos.